sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

1993 - Salgueiro - "Peguei um Ita no Norte"

E o Salgueiro explodiu de felicidade!



Um desfile inesquecível! Assim, sucintamente, posso descrever o que foi a apresentação do Salgueiro que, hoje, 22 de fevereiro de 2013, completa 20 anos.
A alvirrubra da Tijuca naquela ocasião não vencia um carnaval há 18 anos - seu último título fora em 1975, ainda com Joãosinho Trinta, com o enredo "O segredo das minas do rei Salomão". Havia uma expectativa muito grande para o desfile de 1993 por conta do samba que foi um dos mais tocados na temporada pré-carnavalesca.
No desfile de domingo, que foi realizado quase todo debaixo de chuva, os destaques haviam sido a Vila Isabel, com samba de Martinho da Vila, e a Mocidade que trouxe um enredo sobre jogos e abusou da tecnologia. Na noite de segunda feira, desfilariam a Grande Rio (campeã do Grupo A em 1992), seguida pela Caprichosos de Pilares, Salgueiro, Unidos da Tijuca, Estácio (que defendia o título), Beija Flor e Mangueira.
Quando o Salgueiro entrou na Sapucaí, foi de uma garra e entusiasmo impressionantes. O público aclamava a passagem da escola e cantava o samba a plenos pulmões, como jamais visto no Sambódromo.
O enredo da escola, do carnavalesco Mario Borrielo, era inspirado em uma canção de Dorival Caymmi e mostrava a viagem do navio Ita desde Belém do Pará até o Rio de Janeiro trazendo os sonhos dos migrantes por uma vida melhor. Começou o desfile com o Círio de Nazaré, em Belém, passando pelo Nordeste, representado nas alegorias: os azulejos de São Luis do Maranhão, as areias do Rio Grande do Norte, a cultura pernambucana (frevo e maracatu), a culinária baiana (as baianas obviamente vieram neste setor, todas de branco), até chegar em pleno carnaval carioca. As alegorias não tinham muitas inovações estéticas mas eram bem acabadas e contavam muito bem o enredo. Alguns sustos como a queda da porta bandeira Taninha em frente a cabine dos jurados e a correria ao final do desfile por conta do excessivo número de componentes (cerca de 5.500) não desanimaram o público, que aclamava a escola como campeã. Felizmente a escola terminou o desfile dentro do tempo, apesar de uma certa preocupação nos momentos finais. E o Salgueiro se credenciou ao título que buscava há muito tempo. Após sua passagem, ficou praticamente impossível superar toda a emoção e euforia daquela apresentação.

Lembro de ter visto pela TV e ficar muito emocionado no final. A partir de determinado momento, os narradores se mostravam preocupados com o tempo de desfile. A tensão deu lugar a alegria e a felicidade que explodiu não só no Sambódromo.

"Explode coração na maior felicidade, é lindo meu Salgueiro contagiando e sacudindo esta cidade"


O Salgueiro se sagrou campeão, 2,5 pontos a frente da segunda colocada Imperatriz Leopoldinense, além de ter ganho quatro Estandartes de Ouro (escola, enredo, bateria e ala das crianças). Pela primeira vez, eu via a minha escola campeã!

Após esse carnaval, o Salgueiro ficou sem vencer por mais 16 anos. Seu último título foi em 2009, com "Tambor". Entre 1993 e 2009, a escola esteve por muitas vezes fora do desfile das campeãs mas também fez desfiles muito elogiados. O carnavalesco Renato Lage estreou na escola em 2003 com um enredo sobre os 50 anos da escola. Estava previsto um desfile eufórico por conta do samba que remetia ao título de dez anos antes mas a perda de 8 décimos por conta do estouro do tempo de desfile acabou descredenciando a escola à disputa do título daquele ano. Renato continua na escola e já teve seu contrato renovado para 2014.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

O carnaval passou!

Mais um carnaval se foi!
Parabéns a Vila Isabel e a Império da Tijuca (desfile emocionante), campeãs respectivamente do Grupo Especial e da Série A.

Minha programação foi bem intensa!
Sexta feira, único dia em que fui a bloco na rua - particularmente não curto muito, mas esse ano abri uma exceção por conta da companhia de amigos queridos. Não tive a oportunidade de assistir a primeira noite de desfiles da Série A pela TV, pela primeira vez transmitido pela Globo. Tentei ver a Viradouro, última escola da noite, que homenageou os 60 anos do meu Salgueiro, mas não consegui. No dia seguinte, acompanhei um resumo dos desfiles pela TV. Desolador ver a Unidos de Vila Santa Tereza desfilando sem fantasias - componentes da bateria sem camisa, passistas em roupas íntimas. Uma cena muito triste! A União do Parque Curicica reeditou o desfile da Portela de 1994, "Quando o samba era samba". Emocionante! Estácio desfilando suntuosa como há tempos não se via, pena ter ultrapassado um minuto do tempo regulamentar, mas valeu a merecida homenagem ao maestro Rildo Hora. Rocinha irreverente, destaque para a comissão de frente com "churrasquinho de gato". E a Viradouro que lembrou os carnavais memoráveis do Salgueiro com um samba sem refrão que levantou o público, mesmo quando o som do Sambódromo parou.
No sábado, a segunda noite de desfiles da Série A, assisti no Sambódromo. Uma noite emocionante, sem dúvida. Destaque maior para o desfile da campeã Império da Tijuca, com o melhor samba do ano, principalmente quando a última alegoria passou com a imagem de Nossa Senhora Aparecida envolta na bandeira da escola. Decepção com a Tradição, que reeditou o clássico "Das maravilhas do mar, fez-se o esplendor de uma noite" (Portela, 1981), porém fez um desfile pífio e constrangedor. Império Serrano, Caprichosos, Cubango e Unidos de Padre Miguel fizeram boas apresentações, aliás saudades das duas primeiras no Grupo Especial. No desfile da Padre Miguel começou a chover, único momento em que a chuva apareceu, visto que na semana anterior a meteorologia previa dias chuvosos durante todo o carnaval.
Domingo, primeira noite de desfiles do Grupo Especial. Estava no Sambódromo, ansioso para ver minha escola passar, emocionado como de praxe. A estreante Inocentes de Belford Roxo não se intimidou ao abrir a noite, com um enredo em homenagem aos 50 anos de imigração sul-coreana ao Brasil.  O Salgueiro veio em seguida. Foi um desfile maravilhoso, de encher os olhos. De fato Renato Lage é um gênio (e bom saber que renovou o contrato para 2014), conseguiu fazer de um enredo que não se esperava muito um desfile sensacional, com alegorias belíssimas e fantasias luxuosas. Em seguida, a Unidos da Tijuca defendia o título de 2012 com uma viagem à Alemanha e alegorias repletas de efeitos e coreografias, ao estilo do carnavalesco Paulo Barros. Enfrentou problemas com alegorias (quebra, incêndio, pessoas desmaiando por conta do calor), mas no geral fez um desfile incrível - destaque para as alegorias do Playmobil (saudades da infância) e das tulipas de cerveja. A União da Ilha, quarta escola a se apresentar, não conseguiu sustentar a animação, e fez uma passagem fria, apesar das belas alegorias em homenagem ao centenário de Vinícius de Moraes. O samba não funcionou muito bem e o desfile foi apenas burocrático. A Mocidade se apresentou a seguir, com o desfile sobre o Rock in Rio. Um enredo que foi bastante criticado e alegorias e fantasias pouco criativas contrastaram com a bateria sensacional que trouxe paradinhas fantásticas, sem dúvida o que salvou o desfile. Fechando a noite, a Portela trouxe emoção ao homenagear os seus 90 anos e os 400 anos de Madureira. Apesar de um samba maravilhoso, plasticamente a escola veio fraca. A emoção foi a mola propulsora da passagem da azul-e-branco de Madureira, mas ficou faltando um algo a mais.
A segunda noite de desfiles assisti pela TV. Vale ressaltar que a transmissão da rede Globo, mais uma vez foi por demais engessada, não passando um mínimo de emoção, chegando a ser monótona. Minhas considerações não serão como as de domingo, pois ao vivo é infinitamente diferente. A noite foi aberta pela São Clemente, com seu enredo em homenagem a novelas da Globo. Curiosamente, a emissora cortou o desfile - até agora não vi a última alegoria - sem maiores explicações. Particularmente achei que a amarelo-e-preto de Botafogo fez um desfile inferior à Inocentes, mas ainda conseguiu terminar a classificação em décimo lugar, a frente dela e da Mocidade. Em seguida, a Mangueira trouxe as duas baterias - a meu ver esperava algo mais impactante - e, devido a evolução arrastada e uma alegoria que travou na torre de TV, acabou ultrapassando o tempo de desfile em seis minutos. Beija Flor e Grande Rio fizeram desfiles enfadonhos e arrastados, a primeira falando do cavalo mangalarga marchador, a segunda com um enredo um tanto quanto confuso sobre os royalties do petróleo e um samba muito ruim. A Imperatriz fez uma apresentação belíssima e emocionante, como há tempos não via. A homenagem ao estado do Pará trouxe as belezas do estado junto com traços da cultura e da religiosidade de seu povo. A Vila Isabel, que fechou a noite, fez um desfile arrebatador, merecidíssima campeã! Belas alegorias (trabalho da fantástica Rosa Magalhães), o melhor samba do ano cantado a plenos pulmões e bateria fazendo a "festa no arraiá". Me arrependo de não ter ido a Sapucaí na segunda só por conta desse desfile. Sem dúvida, mais um memorável. Quem sabe daqui a alguns anos ele estará aqui no blog, né?

E que venha mais um carnaval. Falta muito?

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Pra tudo se acabar na quarta-feira

E chegou o carnaval!! Usando o título do enredo da Vila Isabel de 1984, cujo samba foi escrito por Martinho da Vila, dedico o post de hoje a todos aqueles que, assim como eu, são apaixonados por essa festa. Esses cinco dias de folia que passam bem mais rápido do que a espera ansiosa por sua chegada, mas que são sempre muito aproveitados.
Uma pausa nos carnavais inesquecíveis que eu vinha postando, para desejar a todos um carnaval maravilhoso. Esse ano, diferente dos anteriores, a rede Globo irá transmitir os desfiles da Série A (nova designação do grupo de acesso, que juntou os antigos grupos A e B) hoje e amanhã, além da transmissão do Grupo Especial domingo e segunda.

De fato, ainda sinto saudades da rede Manchete, que respirava carnaval no período. Lembro que, quando era pequeno e não aguentava assistir os desfiles noite adentro, no dia seguinte a Manchete transmitia o desfile inteiro novamente. Não era um compacto de 10, 15 minutos e sim a repetição do desfile. Para mim, era uma  maravilha!! Fora que a Manchete abdicava de sua programação, isso em épocas que o desfile começava às 19hs. A Globo, muitas vezes, só começava a transmissão depois das novelas... E, no ano de inauguração do Sambódromo (1984), a transmissão foi exclusiva.
Fora a equipe que comentava os desfiles, encabeçadas pelo carnavalesco Fernando Pamplona.
Infelizmente a emissora encerrou suas atividades em 1999 deixando nós, apaixonados pelo carnaval, saudosos de suas maravilhosas coberturas. Que bom que existe a Internet, onde podemos ver os vídeos antigos.

Enfim, estarei de volta na quarta-feira de Cinzas, espero que demore bastante a chegar! E conto minhas impressões sobre os desfiles.

Bom carnaval a todos!

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

1988 - Unidos de Vila Isabel - "Kizomba, a festa da raça"



Mais um desfile para entrar na História! Em 1988, era comemorado o centenário da Abolição da Escravatura. Apesar de não haver obrigatoriedade das escolas apresentarem um tema único - como por exemplo no quadricentenário de fundação do Rio de Janeiro, em 1965; e posteriormente em 2000, na comemoração dos 500 anos do descobrimento do Brasil - quatro escolas optaram por comemorar a data: Tradição, Beija Flor, Mangueira e Vila Isabel.
A escola do bairro de Noel Rosa escolheu o enredo "Kizomba, a festa da raça", de Martinho da Vila, que rendeu um dos sambas mais bonitos da História, de autoria de Luiz Carlos da Vila, Rodolpho e Jonas. Kizomba significa o encontro de pessoas que se identificam em uma festa de confraternização da raça negra.
Pela primeira e única vez o Sambódromo apresentou decoração artística que remeteu àquelas dos anos 1960 e 1970, como pode ser vista na segunda foto.
Na noite de 15 de fevereiro, segunda-feira de carnaval, o desfile foi aberto pela Tradição, vice-campeã do grupo II em 1987. Em seguida, passaram pela Sapucaí a Caprichosos de Pilares, Beija-Flor, Unidos do Cabuçu, Unidos da Ponte, Vila Isabel, Império Serrano e Mangueira, que fechou a noite disputando o tricampeonato.
A apresentação da Vila foi mágica. Às vezes, faltam palavras para descrever. Sem muito luxo - devido a dificuldades financeiras que a escola passava no período pré-carnavalesco - a escola trouxe alegorias com materiais simples nas alegorias, como ráfias, palha, sisal e tecidos com estampas africanas. A comissão de frente veio representando guerreiros africanos. Um desfile realizado sem muito dinheiro, sem brilho, mas com uma impressionante garra dos componentes que levantaram o público, em uma grande festa em homenagem ao negro. Sigo o que muitas pessoas disseram a respeito deste desfile: talvez o melhor de todos os tempos.
A escola foi merecidamente a campeã daquele carnaval, 1 ponto a frente da Mangueira, que também homenageou o negro e trouxe um desfile bem idealizado com um samba empolgante. Mas, sem dúvida, o desfile da Vila Isabel foi arrepiante. E uma apresentação única uma vez que, devido a fortes chuvas que caíram no Rio de Janeiro, o desfile das campeãs daquele ano não foi realizado. Uma pena!


Em tempo: a Vila, depois do incontestável título de 1988, amargou sérios problemas financeiros, inclusive perdendo a quadra onde realizava seus ensaios. Apesar de contar com bons sambas nos anos seguintes, a escola acabou sendo rebaixada em 2000, ao exaltar o índio no carnaval temático dos 500 anos do Brasil. Retornou ao Grupo Especial em 2005 e, no ano seguinte, conquistou seu segundo título, com o enredo "Soy loco por ti América". Desde 2009, tem participado do desfile das campeãs todos os anos.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

1982 - Império Serrano - "Bumbum, Paticumbum, Prugurundum"

A magia do último campeonato do Império.



1982 foi um ano diferente para o desfile das escolas de samba. Segundo o regulamento, as escolas estavam proibidas de colocar figuras vivas em suas alegorias. O desfile foi realizado na Marquês de Sapucaí, ainda com arquibancadas desmontáveis, no domingo 21 de fevereiro e contemplou 12 escolas. Foi aberto pela Unidos de Vila Isabel, penúltima colocada em 1981 - houve uma confusão tão grande na pista que foi decidido que nenhuma escola seria rebaixada. Em seguida, passaram Unidos de São Carlos (campeã do grupo 1-B), União da Ilha (com seu maravilhoso "É hoje"), Mangueira, Salgueiro, Beija Flor, Unidos da Tijuca, Portela, Mocidade, Imperatriz (que defendia o título), Império da Tijuca e o Império Serrano, que entrou na pista já quase ao meio-dia de segunda-feira, sob um sol escaldante.
A Imperatriz trouxe luxo e riqueza jamais vistos para disputar o tricampeonato, com um enredo de Arlindo Rodrigues. Porém, assim como a Beija Flor, infringiu o regulamento ao trazer destaques nas alegorias: ambas perderam seis pontos. O mais curioso é o fato destas escolas terem optado por não respeitar as regras. Talvez possam ter imaginado que não seriam punidas... Enfim, de qualquer forma, abriram caminho para o último campeonato da verde e branco da Serrinha, que havia ficado em último lugar em 1981. Foi um desfile impecável, uma verdadeira crítica ao gigantismo das escolas e uma ode ao samba de verdade e ao carnaval de antigamente, com um enredo das carnavalescas Rosa Magalhães (atualmente na Vila Isabel) e Lícia Lacerda. O nome original do enredo seria "Praça XI, Candelária e Sapecaí", proposto originalmente por Fernando Pamplona, mas as carnavalescas preferiram a onomatopeia - registro do som do surdo - que acabou dando sorte à escola. Ao lembrar momentos marcantes do carnaval de outrora, nos outros cenários anteriores à Sapucaí - como a passagem do minueto do Salgueiro, no enredo "Xica da Silva" (1963) e da escultura de Iemanjá que abriu o desfile "Bahia de todos os deuses", também do Salgueiro (1969) - a escola aproveitou para criticar a supremacia de escolas que abusavam do luxo e de alegorias suntuosas em detrimento ao samba. Um dos carros trouxe esculturas de Joãosinho Trinta e do bicheiro Aniz Abraão David, então, respectivamente, carnavalesco e patrono da Beija-Flor. Vale ressaltar que, no período compreendido entre 1976 e 1981, somente ganharam escolas que eram comandadas por bicheiros.
Como resumir o desfile campeão de 1982? Antológico, inesquecível, a essência do samba na sua forma mais simples. O samba maravilhoso, de autoria de Aluizio Machado e Beto Sem Braço, conquistou o público que vibrou com sua passagem. Um merecido campeonato, acompanhado de seis Estandartes de Ouro: comunicação com o público, samba-enredo, bateria, enredo, personalidade masculina (Jamil Cheiroso) e revelação (Andreia).

"Superescolas de samba S/A, super alegorias, escondendo gente bamba, que covardia..."



O Império assim conquistava seu nono e último título no Grupo Especial. A escola ainda teve algumas glórias na década de 1980, mas acabou rebaixada em 1991, com um desfile bastante criticado sobre os caminhoneiros. Após alguns anos no grupo de acesso, retornou em 1994, sendo rebaixada mais uma vez em 1997, ao homenagear Beto Carrero. Voltou em 1999, quando trouxe um enredo sobre a Rua 46, de Nova York, mas novamente foi rebaixada. Em 2001 retornou ficando até 2007. Uma nova participação no Grupo Especial em 2009, ao reeditar o desfile de 1976, "A lenda das sereiras, rainhas do mar" que injustamente deu o último lugar à escola. Atualmente, está na Série A (nova designação do grupo de acesso), em uma acirrada disputa com mais 18 escolas por uma vaga no Grupo Especial em 2014.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

1989 - Beija Flor de Nilópolis - "Ratos e Urubus, larguem minha fantasia"

"Quem gosta de miséria é intelectual, pobre gosta de luxo"




A frase, proferida por Joãosinho Trinta, um dos maiores carnavalescos da História, falecido em dezembro de 2011, resume bem o que foi esse desfile, assunto de hoje do blog.
O longo desfile do carnaval 1989, com 18 escolas no grupo principal, trasmitido pelas redes Globo e Manchete, caminhava para seu desfecho e, até aquele momento, algumas escolas tinham realizado desfiles bastante elogiados, mas nada comparado ao que aconteceria naquela manhã de terça-feira, com a passagem da Beija Flor de Nilópolis.
O desfile de domingo 05 de fevereiro não teve muitas surpresas, a não ser pela passagem da União da Ilha, que tomou um "porre de felicidade" e contagiou o público do Sambódromo, e o Salgueiro, que comemorou o centenário da Abolição com um ano de atraso no enredo "Templo negro em tempo de consciência negra". Na segunda 06 de fevereiro, o destaque havia sido para a Imperatriz Leopoldinense, que se sagrou campeã com um desfile irretocável e o samba inesquecível "Liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós". A noite foi aberta pela Unidos do Jacarezinho, vice-campeã do grupo II em 1988, seguida pela Imperatriz, Unidos da Tijuca, São Clemente, Estácio de Sá, Vila Isabel (que defendia o título), Portela, Beija Flor e Império Serrano. A escola de Nilópolis, oitava a desfilar, entrou por volta das 7 da manhã, e foi muito aguardada, principalmente pela polêmica que a envolveu nas vésperas do carnaval.A Igreja havia entrado na Justiça proibindo a imagem do Cristo Redentor no abre-alas da escola. Como uma forma de protesto, Joãosinho Trinta trouxe a imagem coberta por sacos de lixo com os dizeres "Mesmo proibido, olhai por nós" e cercada por dezenas de mendigos. Quando a azul-e-branco de Nilópolis entrou na Sapucaí, o público assistiu extasiado a sua passagem, de uma forma jamais vista. Era o "lixo do luxo e o luxo do lixo", como a sinopse do enredo descrevia. Em suma, era uma resposta de Joãosinho às críticas de que só realizava desfiles grandiosos e luxuosos, como de fato era praxe nas passagens da Beija Flor a partir da sua chegada, em 1976.
Um início de desfile com farrapos e sucatas, mendigos que invadiam o Sambódromo em nada lembrando as costumeiras apresentações da escola. A partir do terceiro carro, o desfile começou a ganhar cores e aparecer o luxo. Os setores eram divididos com críticas bastante ácidas à Igreja, à imprensa, à política (o carro trazia uma réplica do prédio do Congresso Nacional), ao lixo do sexo e da guerra (representação dos 4 cavaleiros do apocalipse). À medida que a escola ia evoluindo, o público acompanhava a apresentação entusiasmado, ajudado pelo samba que, apesar de não ser nenhuma obra-prima, era bastante contagiante. Durante a passagem da Beija-Flor, os portões do Sambódromo foram abertos e o público que se aglomerava do lado de fora pode ocupar os espaços vazios das arquibancadas. Um fato inédito que jamais foi repetido. O final apoteótico com o público saudando a escola com gritos de "é campeã!". Uma manhã de carnaval inesquecível!





A Beija Flor acabou terminando na 2ª colocação, com o mesmo total de pontos da Imperatriz (210), porém fora aplicado o critério de desempate que deu o título à verde-e-branco. A Imperatriz de fato fez uma apresentação memorável e mereceu o título, mas o desfile da Beija Flor foi o que marcou aquele ano e entrou para a História.

Joãosinho Trinta ainda esteve à frente da Beija-Flor por mais 3 carnavais. Em 1994, estreou na Unidos do Viradouro, onde conquistou seu último título - e único da escola de Niterói - em 1997, com "Trevas! Luz! A explosão do universo". Mas isso é assunto para um outro post.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

1984 - Portela - "Contos de Areia"

Samba inesquecível no último campeonato da Portela.



O carnaval de 1984 foi marcante para o mundo do samba. Depois de anos montando e desmontando arquibancadas de ferro em diferentes pontos da cidade, finalmente as escolas de samba ganhavam um espaço próprio para realizar seus desfiles. 
O Sambódromo, como é popularmente conhecida a Passarela do Samba até os dias de hoje, começou a tomar forma em meados de 1983, durante o governo de Leonel Brizola. O projeto foi encomendado ao arquiteto Oscar Niemeyer, falecido recentemente, e concluído em cerca de cinco meses. A Marquês de Sapucaí, que já abrigava os desfiles desde 1978, foi o local escolhido para as obras e as escolas teriam uma novidade ao final de suas apresentações: a Praça da Apoteose, espaço que teriam de ocupar estando mais próximas do público. O regulamento também foi modificado: o desfile passaria a ser realizado em duas noites - domingo e segunda-feira - com sete escolas por noite e um corpo de jurados diferente para cada dia e mais um para o sábado seguinte, no chamado supercampeonato (com as três primeiras colocadas de cada dia mais as duas primeiras colocadas do grupo 1-B). Esta regra só valeu de fato para este primeiro carnaval no Sambódromo. A saudosa Rede Manchete foi a responsável exclusiva pela transmissão dos desfiles. As escolas do Grupo 1-A (designação do Grupo Especial na época) desfilaram nos dias 4 e 5 de março.
O desfile que iremos lembrar hoje foi o campeão da primeira noite. A Portela conquistou seu último campeonato invocando os orixás e prestando homenagem a três figuras de suma importância para sua história: Paulo da Portela, Natal e Clara Nunes, que havia falecido no ano anterior.
A azul e branca de Madureira iniciou seu desfile já na manhã de segunda-feira, por volta das 6hs, após as apresentações de Unidos da Tijuca, Império da Tijuca, Caprichosos de Pilares, Salgueiro e União da Ilha. Com um contingente aproximado de 6.000 componentes (um exagero para a época), a escola pisou na Passarela firme. No esquenta, muita emoção com o minuto de silêncio em respeito à morte de Clara Nunes - aquele seria o primeiro desfile da Portela sem a presença da cantora.
A águia, símbolo maior da escola, veio como se tivesse emergindo do mar, apenas mostrando a cabeça. O desfile começou na Bahia, berço dos orixás. Em seguida, o desfile foi dividido em partes, começando pela homenagem ao fundador Paulo da Portela, criador do mundo azul-e-branco, com o orixá Oranian. Para homenagear Natal, foi lembrada a figura do orixá Oxossi. E finalizando com a homenagem à Clara Nunes, com a figura do seu orixá Iansã, com alusão aos ventos e tempestades, trazendo também as congadas e reisados de Minas Gerais, terra da homenageada. O final do desfile foi emocionante, com uma nova águia no setor chamado "Portela na avenida", por acaso canção gravada pela cantora e que por muitos anos embalou os esquentas da bateria da escola.
A passagem arrebatadora da Portela culminou com o campeonato do desfile de domingo, a frente do Império Serrano (segunda colocada, que desfilou em seguida) e da surpresa Caprichosos de Pilares. As três participariam do super-campeonato no sábado.

O samba é memorável. Apesar do desfile ter sido transmitido apenas pela Rede Manchete - que encerrou suas atividades em 1999 e muito de seu material foi perdido - temos a felicidade de poder ver os momentos deste carnaval em vídeos na Internet.



Tive a oportunidade de ver a Tradição reeditando este maravilhoso samba no carnaval de 2004. Emocionante apresentação debaixo de chuva, abrindo a segunda noite de desfiles, com o samba sendo cantado por todo o Sambódromo. De arrepiar!

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

1985 - Mocidade - "Ziriguidum 2001 - um carnaval nas estrelas"

Simplesmente sensacional!




1985 foi um ano mítico para o Brasil. Após 21 anos de ditadura militar, tinha início um período de redemocratização, apesar de ainda não ser possível votar para presidente, o que só viria a acontecer quatro anos depois. Tancredo Neves foi eleito o primeiro presidente civil do país de forma indireta, porém não chegou a tomar posse vindo a falecer e causando comoção nacional.
Esse seria o segundo carnaval no Sambódromo e o primeiro sob a administração da Liga Independente das Escolas de Samba (LIESA), criada em julho do ano anterior. Dezesseis escolas desfilariam pelo Grupo 1-A (designação do Grupo Especial naquela ocasião), sendo oito escolas em cada noite e com um único corpo de jurados para os dois dias. Lembrando que, no carnaval de 1984, ano da inauguração da Passarela do Samba, havia um corpo de jurados para domingo e outro diferente para segunda-feira, e diferentes regras que culminaram com o supercampeonato da Mangueira.
Domingo, 17 de fevereiro. O desfile foi transmitido por três emissoras: Globo, Manchete e Bandeirantes e foi aberto pela Em Cima da Hora, seguida pela Unidos do Cabuçu, Império da Tijuca, Salgueiro, União da Ilha, Vila Isabel, Mangueira - que defendia o título - e a Mocidade, que iniciou seu desfile já por volta das 08h15 da manhã.
A Mocidade se apresentou de uma forma arrebatadora e, com muitos méritos, se tornou a campeã daquele ano. O carnavalesco Fernando Pinto estava inspiradíssimo e preparou um carnaval impecável, com alegorias e fantasias maravilhosas que causaram impacto e levantaram o público.
Alegorias representando o sistema solar, com muitos efeitos e movimentos e focos nas cores branco e prata, que reluziam a luz do sol. Comissão de frente trazendo robozinhos com a bandeira do Brasil. Baianas com asas, capacetes e antenas, uma inovação espetacular. Bateria sensacional vestida de astronautas trazendo as famosas paradinhas. Para fechar o desfile, a "nave-mãe", trazendo os sambistas de volta do "carnaval nas estrelas" - um carro acoplado, que era uma novidade para a época. Ovacionada na Praça da Apoteose, a escola de Padre Miguel fechou seu desfile deixando o público e a crítica especializada com a certeza de ter realizado uma apresentação histórica.

O samba ficou marcado naquele ano e até hoje é lembrado.

"Vou à lua, vou ao sol, vai a nave ao som do samba..."

Aquela manhã de segunda-feira de carnaval foi mágica, um despertar para o futuro.. e pensar que já passamos de 2001... quem sabe em 3001 teremos um carnaval nas estrelas... não custa sonhar! (aliás, como a própria Mocidade cantou sete anos depois).



E na noite de segunda-feira, ainda desfilaram mais 8 escolas com destaque para a Caprichosos de Pilares, que fez um desfile inesquecível. "E por falar em saudade" foi vencedor do Estandarte de Ouro e deu a honrosa quinta colocação para a simpática agremiação de Pilares. Mas isso é assunto para um outro post.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

1969 - Salgueiro - "Bahia de todos os deuses"

Só tenho uma frase para iniciar este post... "eu gostaria muito de ter visto este desfile".





Fevereiro de 1969. Em plena ditadura militar, apenas alguns meses após o decreto do Ato Institucional 5 (AI-5) que deu início ao período mais turbulento da História recente do Brasil, chegava mais um carnaval. As escolas de samba se preparavam para apresentar mais um espetáculo e, naquela ocasião, o cenário era a Avenida Presidente Vargas, tendo início na Candelária. Dez escolas de samba se apresentariam no domingo 16 de fevereiro. Naquela época, o desfile era realizado em apenas um dia e, por vezes, terminava após o meio-dia de segunda feira, em uma verdadeira maratona.
O ano trouxe obras-primas memoráveis como "Heróis da Liberdade", que Silas de Oliveira, Mano Décio da Viola e Manoel Ferreira compuseram para o Império Serrano; "Yayá do cais dourado", de Martinho da Vila, da Unidos de Vila Isabel; "Brasil, flor amorosa de três raças", da Imperatriz Leopoldinense; e, claro, o samba que dá título ao post.
Samba clássico do Salgueiro, que deu o quarto título à escola, de autoria de Bala e Manuel Rosa, que canta as belezas da Bahia, focando na religiosidade latente naquela terra. No desfile, ele foi cantado por Elza Soares com sua voz marcante.
A escola iniciou seu desfile próximo ao meio-dia, um calor forte como de costume no verão do Rio de Janeiro. O inesquecível abre-alas trouxe uma Iemanjá de cerca de 3 metros de altura (foto acima), feita em papel-machê e gotas de espelho que formaram uma cascata de luz que refletia o forte sol daquela manhã. Um momento único, que teve poucos registros de imagem. A escola finalizou o desfile de 1969 levantando o público e consagrando os carnavalescos Fernando Pamplona e Arlindo Rodrigues. Mais um título para a Academia do Samba!

Bahia, os meus olhos estão brilhando
Meu coração palpitando
De tanta felicidade
És a rainha da beleza universal
Minha querida Bahia
Muito antes do Império
Foste a primeira capital
Preto Velho Benedito já dizia
Felicidade também mora na Bahia
Tua história, tua glória
Teu nome é tradição
Bahia do velho mercado
Subida da Conceição
És tão rica em minerais
Tens cacau, tens carnaúba
Famoso jacarandá
Terra abençoada pelos deuses
E o petróleo a jorrar
Nega baiana
Tabuleiro de quindim
Todo dia ela está
Na igreja da Bonfim, oi
Na ladeira tem, tem capoeira

Zum, zum, zum
Zum, zum, zum
Capoeira mata um! (bis)


Em tempo: Antes, o Salgueiro havia sido campeão em 1960 ("Quilombo dos Palmares"), dividindo o título com outras quatro escolas: Portela, Mangueira, Unidos da Capela e Império Serrano; em 1963 ("Chica da Silva") e em 1965 ("História do carnaval carioca").

Comecei o post falando que gostaria de ter visto este desfile, assim como tantos outros dos anos 1960, 1970 e 1980.
De certa forma, tive a oportunidade de ver a Tradição reeditando este samba no Grupo de Acesso em 2006 e me emocionei quando a última alegoria trouxe a bandeira do Salgueiro, prestando uma merecida homenagem.

domingo, 20 de janeiro de 2013

Para começar!

Moro no Rio de Janeiro, tenho 32 anos (quase 33), historiador e consultor de viagens, um apaixonado pelo carnaval, mais especificamente pelo desfile das escolas de samba, que acompanho desde bem pequeno, acho até que desde quando nem entendia exatamente do que se tratava. Pela TV, do que minha memória consegue lembrar, acho que comecei a assistir no final dos anos 1980. Ao vivo no Sambódromo, comecei em 2000 e desde então todos os anos estou lá religiosamente. Torço pelo Salgueiro mas tenho simpatia por outras escolas e reconheço quando a minha não faz um bom desfile. Considero desfiles memoráveis de outras escolas, me emociono com desfiles antigos - que sempre assisto graças a Internet e aprecio os sambas, seja de qual escola for. É bem verdade que muita gente diz que os sambas de hoje não chegam nem aos pés daqueles clássicos de 40 ou 50 anos atrás, porém, como passei a acompanhar o samba já com esse andamento e o desfile como um espetáculo de magnitude internacional, foi assim que fui conquistado.

O nome do blog, também título do enredo da Portela em 1979, sintetiza a minha impressão do carnaval. Todo ano é uma emoção diferente quando chego na Sapucaí e ouço os primeiros acordes das baterias maravilhosas. Parece sempre a primeira vez!

Neste espaço vou escrever um pouco sobre carnavais antigos, mostrar minhas opiniões sobre o tema, modestamente ser uma fonte de consulta, permitindo receber críticas e comentários daqueles que também são amantes do carnaval, como eu.

Sejam bem-vindos a este humilde espaço, apertem os cintos e façam uma viagem ao mundo maravilhoso do carnaval que me conquistou e espero conquistar vocês também!